quarta-feira, 16 de abril de 2014

Moolaadé (Moolaadé) 2004



A história gira em torno de Collé (Coulibaly), a do meio de três mulheres, numa vila isolada do Burkina Faso. Ela já não cai nas graças dos restantes habitantes por ter deixado a sua filha (Traoré), saltar o ritual da purificação da excisão do clitóris, um ritual (tortura) habitual em África, e que pode levar as adolescentes à morte, como agora também deu guarida a quatro jovens que pretendem fugir a este mesmo ritual invocando a moolaadé (uma protecção sagrada invocada por uma corda colorida). Mas os líderes da aldeia estão fartos da rebelião de Collé, e pressionam o marido para que ela retire a protecção, nem que para isso tenha de chicoteá-la. 
Chamado "o pai do cinema africano", o senegalês Ousmane Sembène tinha 81 anos quando fez este filme, uma obra que tem tanto de elegante como de incendiária. A questão da mutilação genital feminina é complexa. A prática desta tortura é antiga, mas apesar da insistência dos mais velhos na aldeia, não é obrigatória. Ironicamente, o colonialismo europeu em África reforçou o impulso pela autoridade masculina, que procurou contrariar as bases matriarcais de uma parte considerável da história e mitologia africana. A humilhação que os homens africanos sofriam na altura do colonialismo requereram a dominação das mulheres, para retirarem uma certa compensação psíquica. A prática da circuncisão feminina era vista com uma defesa contra a influência ocidental, que por sua vez, era vista como uma ameaça à cultura tradicional africana. Sembène enfatiza este ponto no filme, quando na aldeia são confiscados e queimados todos os rádios das mulheres. 
A mensagem transmitida é que algumas tradições devem mudar, e que nenhuma comunidade pode impedir a modernização, ou o seu povo ficará ignorante para sempre. É uma declaração forte para o povo africano, mesmo já no século 21, e um caminho que deve ser seguido. Como um todo "Moolaadé" é fantástico, e surpreendentemente envolvente, um grande exemplo de cinema africano e uma declaração dos verdadeiros problemas que envolvem a independência africana. Filme muito premiado, que saíu vencedor do prémio Un Certain Regard Award em Cannes, na edição de 2004. Era o último filme de Ousmane Sembène, que morreria três anos depois em Dakar.

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